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Geral

A Evolução da Medicina Veterinária no Paraná


Publicado em: 24/10/2011 12:24 | Categoria: Geral

 

Artigo

* Artigo publicado no Boletim do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná - Volume LIV
Edição comemorativa do Sesquicentenário do Paraná - 1853/2003


Em 19 de dezembro de 1953, o Paraná completou o primeiro centenário de sua emancipação política. Ao longo do ano, muitos eventos lembraram a importância desta data histórica. Numerosos congressos nacionais, das mais variadas especialidades foram realizados em Curitiba, com o objetivo de mostrar aos profissionais de diferentes áreas nossas belezas, nossa pujança, nossos valores e nosso interesse em dar a conhecer um pouco de nossa História. Na ocasião era Governador do Estado o Dr. Bento Munhoz da Rocha Neto, um intelectual de peso e um paranista convicto que soube dar às comemorações de nosso primeiro centenário dimensões capazes de ecoar em todo o país.
De 19 a 24 de novembro de 1953, no Colégio Estadual do Paraná foi realizado o VI Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária. Tenho em meus arquivos os Anais do referido Congresso porque meu Pai, Professor Dr. Manoel Lourenço Branco foi quem fez a saudação aos congressistas na sessão preparatória, realizada no salão nobre do Colégio Estadual do Paraná, em 19 de novembro de 1953, com início às 10,30 horas. Como aluna do Colégio, fui assistir a uma parte desta sessão.
Neste mesmo dia 19, às 20 horas, houve a sessão solene de abertura com a presença de autoridades e uma saudação aos congressistas feita pelo Governador Bento Munhoz da Rocha Neto. Na sua brilhante alocução o Governador lembrou a tradição pecuária de nosso estado citando o fato de algumas antigas cidades paranaenses terem sido formadas pelos tropeiros que, do Rio Grande do Sul iam a Sorocaba, passando por nossas terras. Lembrando o ciclo do ouro da província de Minas Gerais, contou que um boi, em 1720, era vendido em Vila Rica por cem oitavas de ouro em pó. Este boi era produto de nossos campos e cem oitavas de ouro em pó equivaliam a dez mil cruzeiros ( em novembro de 1953 ). Disse ainda nosso Governador que, a despeito da equipe do Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas, empenhada em cooperar com a pecuária, o início do “ciclo cafeeiro” em nosso estado havia determinado uma queda de nossa produção animal. Mostrando como estava bem informado sobre o papel dos Médicos Veterinários, Dr. Bento disse:
... “O Paraná, tradicionalmente, foi um Estado pecuarista. Os grandes, os tradicionais caminhos do Paraná, foram caminhos de tropas. As antigas cidades paranaenses foram formadas pelos tropeiros, desde as tropas do Rio Grande do Sul até a Feira de Sorocaba”.

... “A Veterinária, portanto, pesquisando, indagando, adaptando ao nosso meio conhecimentos universais, tem uma grande função neste momento. O Brasil sofre de fome crônica. Em muitos setores está se transformando nosso sistema de alimentação. A produção animal precisa acompanhar a produção geral, como acontece com a produção agrícola.”
Embora o Paraná apresentasse uma inconteste vocação pecuária só em 7 de abril de 1931 foi criado o primeiro Curso de Medicina Veterinária em nosso estado. As atividades do novo Curso tiveram início em 16 de abril do mesmo ano e, nesta data, a Congregação da Escola Agronômica do Paraná, em sessão especial, aprovou os Estatutos e o Regimento Interno da referida Escola, já com a inclusão do Curso de Medicina Veterinária. O Diretor da Escola Agronômica do Paraná era o Professor Catedrático João Cândido Ferreira Filho, sendo Secretário da Escola o também Professor Catedrático Joaquim Ignacio Silveira da Mota. O estado do Paraná era governado pelo General Interventor Federal Mário Alves Monteiro Tourinho. Em dezembro de 1934, formava-se a primeira turma de Médicos Veterinários.
Os diplomas, expedidos pela Escola Agronômica do Paraná foram assinados pelo Diretor Dr. Raul Gomes Pereira, Agrônomo diplomado pela Escola Agronômica do Paraná e Médico Veterinário diplomado pela Escola de Veterinária do Exército na Capital Federal ( Rio de Janeiro ). Eram integrantes desta primeira turma de Médicos Veterinários Antônio Carlos de Araújo Moritz, Arlindo Loyola de Camargo ( que ao entrar no Curso já era Engenheiro Agrônomo ), Leônidas Vicente de Castro, Evaristo Cícero de Moraes, e Paulo Francisco Beckert. Os três primeiros tiveram importante atividade como Professores do Curso de Medicina Veterinária, sendo que os Professores Antônio Carlos de Araújo Moritz e Arlindo Loyola de Camargo desempenharam, também, funções administrativas chegando à Direção da Escola e o Dr. Leônidas Vicente de Castro foi o primeiro Diretor do Hospital Veterinário de nossa Universidade. Dr. Evaristo Cicero de Moraes exerceu suas atividades na Divisão de Biologia Animal do Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas ( IBPT ).
Neste mesmo dezembro de 1934, através do decreto nº 2518, datado do dia 4, o Governo do Estado do Paraná tornava autônoma a Escola Superior de Veterinária do Paraná. Coube ao Prof. Dr. Gamaliel Pereira de Carvalho, diplomado pela Escola de Veterinária do Exército, o cargo de Diretor da nova unidade, de 1935 a 1943.
Em 11 de janeiro de 1941 o decreto nº 10888 do Governo do Estado do Paraná criou o Instituto Técnico de Agronomia, Veterinária e Química do Paraná. A esta altura os Cursos de Agronomia e Veterinária já estavam funcionando em um imóvel que havia abrigado a Escola de Trabalhadores Rurais Carlos Cavalcanti, o mesmo prédio em que estão hoje, na Rua dos Funcionários, a Administração e outras instalações didáticas e de pesquisa do Setor de Ciências Agrárias da UFPR. Anexando o Curso de Química à antiga Escola Agronômica do Paraná, o Instituto Técnico de Agronomia, Veterinária e Química do Paraná passava a ter uma estrutura administrativa semelhante à de uma Universidade havendo um Reitor e Diretores para cada um dos Cursos.
Os Diplomas deste período, expedidos pela Escola Superior de Veterinária do Paraná, reconhecida pelo Decreto Federal nº 8463 de 24 de dezembro de 1941 e integrante do Instituto Técnico de Agronomia, Veterinária e Química do Paraná eram assinados pelo Reitor e pelo Diretor. O título fornecido aos formandos era de Veterinário e não de Médico Veterinário, como anteriormente. Dados colhidos no Diploma de Veterinário do Professor Dr. Milton Giovannoni, datado de 5 de janeiro de 1942, revelam que o Reitor do Instituto era Dr. Carlos de Paula Soares e o Diretor da Escola Superior de Veterinária do Paraná era o Professor Dr. Gamaliel Pereira de Carvalho. A carta de Professor Catedrático de Zootecnia Especial do Médico Veterinário Arlindo Loyola de Camargo, datada de 2 de setembro de 1944, é assinada pelo Reitor do Instituto Técnico de Agronomia, Veterinária e Química do Paraná, Professor Dr. Anchises Marques de Faria e pelo Diretor da Escola Superior de Veterinária do Paraná, Professor Dr. Antônio Carlos de Araújo Moritz.
Em 27 de dezembro de 1944, através do Decreto Lei nº 295, a Interventoria Federal do Paraná extinguia o Instituto Técnico de Agronomia Veterinária e Química do Paraná e, pela fusão da Escola Agronômica do Paraná com a Escola Superior de Veterinária do Paraná, criava a Escola Superior de Agricultura e Veterinária do Paraná. A nova Instituição foi reconhecida pelo Decreto Federal nº 17989 de 7 de março de 1945. Do diploma continuou a constar o título de Veterinário.
Embora, como instituição estadual a Escola Superior de Agricultura e Veterinária do Paraná contasse com sede própria, seu corpo docente lutou irmanado pelo processo de federalização visando melhor amparo financeiro que desse apoio aos projetos de expansão do ensino agro- veterinário no Paraná. Foram sete anos de luta até que em dezembro de 1955 foi alcançado o objetivo passando a Escola ao controle da Superintendência do Ensino Agrícola e Veterinário do Ministério de Agricultura. O passo definitivo para o processo da federalização havia sido dado pelo Prof. Dr. Caio Graccho Pereira, Engenheiro Agrônomo e então Diretor da Escola de Veterinária do Paraná, conseguindo que os Deputados da bancada paranaense apresentassem uma emenda ao ante-projeto de Federalização das Escolas de Agronomia e Veterinária dos estados do Ceará, Paraíba, Bahia e Rio de Janeiro, incluindo nossa Escola. Entretanto vários interesses em jogo retardaram o andamento da federalização.
Como resultado da federalização ampliaram-se os laboratórios, houve compra de equipamentos diversos, criaram-se Departamentos reunindo cadeiras afins, surgiram os primeiros cursos de Extensão Universitária, a fazenda da Escola começou a florescer com projetos tanto na área de Veterinária como na de Agronomia e o acervo da biblioteca foi ampliado. Mas, nossos Professores sabiam que mais uma etapa deveria ser cumprida para que a Escola pudesse atingir seus objetivos: em 9 de abril de 1957, a Congregação, constituída pelos seus Professores Catedráticos, optou pela transferência da Escola para o Ministério da Educação e Cultura com incorporação à Universidade Federal do Paraná. A decisão traduzia o anseio da maioria absoluta dos Professores pois houve um único voto contrário. Argumentavam nossos Professores que a semente de nossa Escola havia sido a própria Universidade e consideravam que precisaríamos voltar à Universidade para podermos desenvolver atividades de ensino e de pesquisa contribuindo para a consolidação de um espírito humanístico de alta cultura, como deve ser a cultura universitária. Faltando este ambiente característico da Universidade uma Escola isolada poderá ser uma escola profissional de nível superior ou uma escola técnica especializada mas não será, nunca, uma verdadeira escola de alta cultura. Entretanto a decisão da Congregação desencadeou etapas burocráticas morosas e somente em 19 de dezembro de 1961 aconteceu a Assembléia Universitária em que foi incorporada à Universidade do Paraná a Escola de Agronomia e Veterinária ( nome adotado no momento de transferência para a Universidade ). O então Diretor da Escola, o Engenheiro Agrônomo Professor Dr. Lycio Grein de Castro Vellozo, no seu discurso deixou claro que estava sendo incorporada à Universidade uma instituição com uma tradição de trabalho e de lutas, “sentimo-nos felizes, Magnífico Reitor, em não chegar até aqui com as mãos vazias e, como mendigos desamparados e exânimes, bater-lhe às portas na esperança de uma esmola piedosa ou de um olhar compassivo.
Vimos sim, trazendo-lhe uma Escola ilustre pela tradição de 43 anos de funcionamento ininterrupto; um patrimônio material assegurado e orçamentariamente estável; um corpo docente cônscio de suas responsabilidades e coeso na afirmativa dos seus propósitos; um corpo discente disciplinado e imbuído de um desejo alcandorado de vencer.
Mais do que isto, trazemos-lhe a certeza de que nunca seremos, na Universidade, uma excrescência, uma nódoa ou mesmo uma nota dissonante. Porque nossas instituições malgrado até aqui separadas, provêm das mesmas sementes, que os mesmos semeadores semearam no solo fértil do Paraná em 1912; porque nossas entidades sempre caminharam paralelas. Nunca se distanciaram, mantiveram ligações e anastomoses que evidenciaram, neste período de quase meio século, pensamentos uníssonos relações harmoniosas.
Neste longo palmilhar, neste lento transcorrer dos dias e dos anos da ampulheta do tempo, nas lutas e nas glórias, na abnegação e no sacrifício. Tudo nos uniu, pouco nos separou.
E é desta maneira, cultuando os mesmos mortos, honrando as mesmas tradições, pugnando e sonhando para os mesmos fins, que a Escola de Agronomia e Veterinária se integra em definitivo, na Universidade do Paraná”.
Quando nos incorporamos à Universidade do Paraná o Magnífico Reitor era o Professor Dr. Flávio Suplicy de Lacerda, Engenheiro Civil e Professor de grande competência, demonstrou ser um administrador excepcional tendo dado à nossa Universidade uma expansão absolutamente extraordinária. Assim, nesta ocasião, a união de um Reitor de visão e de um Diretor empreendedor nos trouxe grandes benefícios.
No ano de 1970, como decorrência de alterações nos estatutos da Universidade Federal do Paraná aconteceram novas modificações separando-se os Cursos de Veterinária e Agronomia, sendo criadas a Faculdade de Medicina Veterinária e a Faculdade de Agronomia. Em 4 de janeiro de 1971, assumiu a Direção da Faculdade de Medicina Veterinária o Professor Dr. Pedro Pimpão de Azevedo e foi empossado na Direção da Faculdade de Agronomia o Professor Dr. Lívio Luiz de Almeida.
Na década de 70 a estrutura das universidades brasileiras sofreu profundas transformações, separando-se as disciplinas do que se convencionou chamar de ciclo básico que passaram a funcionar em Institutos, ficando nas antigas Faculdades somente as disciplinas integrantes do chamado ciclo profissionalizante. Os Cursos de Medicina Veterinária, de Engenharia Agronômica e o de Engenharia Florestal - incorporado à Escola de Agronomia e Veterinária na década de 60 – voltaram a constituir uma unidade com um Diretor único e estão, hoje, no chamado Setor de Ciências Agrárias.
Ao longo de todos estes anos foram sendo feitas modificações e reajustes curriculares na dependência de imperativos legais e de adaptações necessárias devido ao progresso da profissão.
Outro detalhe a ser mencionado na história recente do Curso de Medicina Veterinária foi a criação, em 1993, de um Campus da Universidade Federal do Paraná na cidade de Palotina. Com dez anos de funcionamento esta unidade de ensino de Medicina Veterinária vem demonstrando uma eficiência notável e representou um passo importante para a interiorização do ensino em nosso estado.
Mais recentemente surgiram os Cursos de Medicina Veterinária da Pontifícia Universidade Católica do Paraná ( implantado em 1995 ) e da Universidade Tuiuti do Paraná ( funcionando desde 1998 ). Em várias outras cidades de nosso estado existem Cursos de Medicina Veterinária, sendo importante mencionar que são de excelente qualidade os cursos de graduação e de pós-graduação da Universidade Estadual de Londrina.
Muito antes de surgirem outros Cursos de Medicina Veterinária, em 1941, foi criada uma instituição que deu um grande impulso à agropecuária paranaense. O Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas ( IBPT ) foi fundado pelo Interventor Manoel Ribas e representava, no dizer do Professor Dr. Manoel Lourenço Branco, “complemento necessário da Escola Superior de Agricultura e Veterinária do Paraná destinando-se ao levantamento da nossa agricultura e nossa pecuária”. A história do IBPT está indissociavelmente ligada ao Professor Dr. Marcos Augusto Enrietti. Nascido em São Paulo, mas filho de italianos, Dr. Marcos fez o curso de Agronomia na França e concluiu o Curso de Veterinária em Curitiba, formando-se em 1937. Sua mãe era casada, em segundas núpcias, com o Interventor Manoel Ribas. Recusando outras possibilidades de carreiras mais tentadoras, Dr. Marcos estagiou no Instituto Biológico de São Paulo e, voltando a Curitiba, levou o padrasto Interventor Federal a criar um Laboratório de Análises e Pesquisas vinculado ao Departamento de Agricultura do Governo do Estado. Dele nasceu o Instituto de Biologia Agrícola e Animal que, por sua vez, se transformou no Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas. Tanto o Interventor Manoel Ribas como o Dr. Marcos Augusto Enrietti tiveram uma fantástica visão do que poderia representar a pesquisa científica para o desenvolvimento do Estado do Paraná. Os Cursos de Agronomia, de Veterinária e de Química muito se beneficiaram com o IBPT. Os Professores destes Cursos eram pesquisadores do IBPT e seus laboratórios estiveram sempre abertos para os alunos. Segundo um relatório datado de 1941, “Os influxos do pensamento experimental que os laboratórios do Instituto fizeram surgir em Curitiba alcançariam, imediatamente, o espaço da Universidade do Paraná. Estabeleceu-se entre as duas instituições uma espécie de divisão tácita de trabalho: a Universidade ensinava, o Instituto experimentava”.
Esta cooperação entre o IBPT, dirigido pelo Professor Dr. Marcos Enrietti, um cientista que vislumbrou para a mais antiga Universidade do Brasil um futuro brilhante, se manteve por longos anos. A Divisão de Patologia Experimental do IBPT, mais tarde chamada Divisão de Bioquímica, encontrou na pessoa do Professor Dr. Metry Bacila, Professor Catedrático de Bioquímica do Curso de Veterinária, um extraordinário formador de profissionais que se distribuíram por nosso país e pelo exterior. Da interação entre a Divisão de Bioquímica e a Escola de Veterinária surgiram os Cursos de Fisiologia de Microorganismos um empreendimento científico notável que reuniu em Curitiba, durante muitos anos, no período de verão, os maiores expoentes das Ciências Biomédicas, trazendo renomados pesquisadores do exterior para, em regime intensivo, ministrarem um Curso de Pós-Graduação, muito antes de se pensar na implantação da Pós-Graduação no Brasil. O Curso atraía Professores brasileiros e colegas de países sulamericanos, hoje integrantes do Mercosul. Todos eram interessados por Bioquímica, Fisiologia de Microrganismos, Microbiologia e Imunologia e Curitiba assumiu, durante alguns anos, uma posição de liderança científica entre jovens Professores e Pesquisadores.
Paralelamente, um grupo de Veterinários de escol, liderado pelos Professores Doutores Astolpho Macedo de Souza Filho, Milton Giovannoni, Oscar Krebs Palmquist, Gastão Langman Kubiack, Ângelo Molfi, Fridolim Schlögel, Ruy Santos e Orisel Curial iniciava um trabalho pioneiro na Divisão de Biologia Animal do IBPT. Eram todos Professores de nosso Curso de Veterinária e todos usavam as instalações do IBPT para as aulas práticas como importantíssimo complemento das atividades levadas a efeito na Escola.
Situações semelhantes aconteceram com os Cursos de Agronomia e de Química pois os Professores eram, também, pesquisadores do IBPT e a instituição estadual ampliava as possibilidades de aprendizado oferecidas pela UFPR.
Em um período cujo início pode ser situado na metade do século XX surgiram no Curso de Medicina Veterinária Professores que eram pesquisadores e se empenharam para criar na Escola instalações adequadas para um ensino de boa qualidade e oferecer aos estudantes conhecimentos atualizados e ajustados à realidade do estado e do país. Muitos nomes podem ser lembrados e devem integrar a memória da Medicina Veterinária paranaense, norteando a conduta dos colegas paranaenses ou daqueles que adotaram nosso estado como se fosse o seu torrão natal. Dr. Metry Bacila, Médico, foi quem organizou a disciplina de Bioquímica – inicialmente chamada de Química Biológica. Dr. Manoel Lourenço Branco, Veterinário formado pela Escola de Veterinária do Exército foi o responsável pela instalação do primeiro Laboratório de Fisiologia da Escola; tinha sólidos conhecimentos da matéria, aliados a uma notável cultura humanística e mostrava aos alunos que a cultura geral deveria ser aprimorada, paralelamente, aos conhecimentos técnico-científicos. Quem também tinha uma ampla visão geral era o Professor Dr. Marcos Enrietti cujas atividades levaram à implantação de excepcionais possibilidades de pesquisa e de trabalho, engrandecendo a Medicina Veterinária e melhorando a nossa agropecuária. Dr. Anchises Marques de Faria era Médico e Veterinário, formado pela Escola de Veterinária do Exército, e foi excelente Professor de Anatomia Patológica, tendo um Assistente igualmente competente e dedicado o Professor Dr. Orisel Curial. Após uma longa temporada de estudo e trabalho no Instituto Biológico de São Paulo aportou a Curitiba o Professor Dr. Milton Giovannoni que foi um extraordinário Professor e pesquisador na área de Parasitologia Animal; entretanto, chegando em Curitiba foi contratado para responder pela cadeira de Patologia Animal - aceitou o desafio e teve um ótimo desempenho. O Professor Giovannoni foi uma grande autoridade em toxoplasmose e, mais tarde, fez o curso de Medicina em nossa Universidade. Quem assumiu, após concurso de cátedra, a Patologia Animal foi o Professor Dr. Ruy Santos, dedicado e extremamente competente. Na Parasitologia, anteriormente, trabalhou o Professor Dr. Gastão Lagman Kubiack que faleceu tragicamente. Dois Professores marcaram a área de Microbiologia e Imunologia: Dr. Oscar Krebs Palmquist e Dr. Fridolim Schlögel. Dr. Palmquist, entre outras pesquisas, estudava a brucelose e, em 1949, publicou um artigo com a auto-observação da brucelose ( febre de Malta ); ao trabalhar com Brucella abortus o Professor se contaminou e seu trabalho descreve com minúcias as manifestações ocorridas. Dr. Fridolim havia estagiado no Rio de Janeiro no Instituto Oswaldo Cruz ( Manguinhos ) e era muito dedicado na preparação de atividades práticas; freqüentemente levava os alunos até pequenas propriedades na periferia de Curitiba para pesquisar a incidência de tuberculose, de brucelose e de aftosa em bovinos. Outro Professor inesquecível foi Dr. Astolpho Macedo de Souza Filho, Professor de Higiene e Saúde Pública: profissional competente, grande autoridade na área de Sanidade Animal foi um pesquisador de primeira linha, excelente Professor e um gentleman, tendo sido um eficiente Diretor da Escola de Agronomia e Veterinária. Na Anatomia merece um destaque o Professor Dr. Pedro Pimpão de Azevedo que foi responsável pela construção de magníficas instalações para Anatomia adaptadas para diferentes espécies animais; também foi Diretor no início dos anos setenta e teve que administrar os muitos problemas decorrentes da reforma universitária, implantada à revelia do corpo docente. O Professor Dr. Jaziel Sottomaior Lagos levava os alunos para matadouros e frigoríficos onde ensinava as bases práticas da Inspeção e Tecnologia de Produtos de Origem Animal. O Professor Dr. José Quirino dos Santos iniciava os alunos nos conhecimentos de Zootecnia da mesma forma: promovia visitas a pequenas propriedades observando as condições em que eram criados aves, suínos, ovinos e bovinos passando, também, por numerosos haras. O mesmo sistema itinerante era usado pelo Professor Dr. Sylvio Bove, Professor de Cirurgia. Na época, Anestesiologia, Técnica Cirúrgica, Clínica Cirúrgica e Obstetricia eram ministradas em conjunto, e Dr. Sylvio ensinava algumas técnicas básicas de Odontologia. Guiados pelo Professor Sylvio os estudantes faziam cirurgias em propriedades nas imediações de Curitiba, realizavam atendimentos obstétricos e foi ele um pioneiro na discussão do significado dos animais selvagens no contexto da Medicina Veterinária. Sendo Veterinário da Prefeitura Municipal de Curitiba, atendia os animais então alojados no Passeio Público e levou seus alunos a fazerem as primeiras reflexões sobre a importância dessas espécies.
Uma outra vertente importante para a evolução da Medicina Veterinária corresponde ao trabalho pioneiro desenvolvido pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento e a nossa Secretaria Estadual de Agricultura. Os colegas destas instituições levaram ao homem do campo os avanços capazes de melhorar as condições sanitárias e o rendimento de nossos animais. Com estas práticas, foi possível a oferta de produtos de origem animal dentro dos padrões de qualidade e higidez preconizados pelas normas sanitárias em vigor, assegurando melhores produtos para consumo pela população e ampliando as possibilidades de comercialização. Poderiam ser citadas, como exemplos deste progresso, as campanhas de controle de tuberculose, de febre aftosa, de brucelose, de peste suína e de raiva. Em todos estes casos o trabalho desenvolvido e os resultados alcançados, deram credibilidade à atuação de nossos colegas.
Podemos considerar que o marco inicial da atividade veterinária em Curitiba foi a criação, pela Prefeitura Municipal de Curitiba, em 31 de julho de 1912, do primeiro cargo de “Veterinário encarregado de fiscalizar a matança do gado no matadouro e o destinado a xarqueadas...” O primeiro Veterinário do Matadouro Público foi o Médico Veterinário Dr. Constantino Stroppa, formado em Milão, Itália, tendo sido nomeado em 1 º de setembro de 1912. Nestes 90 anos o progresso acontecido foi notável.
O VI Congresso Brasileiro de Veterinária, realizado em Curitiba, em 1953, reuniu 349 Veterinários ( Membros Efetivos ) registrando, ainda, a participação de Membros Facultativos correspondentes a 38 Estudantes de Veterinária, 15 Agrônomos, 3 Médicos e 11 Criadores. Trinta e oito anos mais tarde, em 1992, o XXII Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária realizado em Curitiba reuniu 1500 participantes e, em 2002, o I Congresso Brasileiro de Especialidades em Medicina Veterinária reuniu 1100 participantes.
Do marco inicial, com o trabalho de Constantino Stroppa, passando pelos pioneiros que criaram, instalaram e viabilizaram o funcionamento do primeiro Curso de Veterinária no Estado, analisada a extraordinária contribuição dos Veterinários técnicos dedicados do IBPT, considerando o trabalho dos colegas da Secretaria e do Ministério da Agricultura, houve um notável progresso e uma expansão considerável. Segundo dados atuais do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Paraná existem 5406 colegas inscritos e, destes, 3903 estão em atividade. O incremento numérico é menos importante do que o progresso técnico-científico registrado ao longo destas sete décadas transcorridas desde a criação de nosso primeiro Curso de Medicina Veterinária.
Com relação ao número de Cursos, estes vêm proliferando, na capital e no interior de nosso estado, multiplicando as possibilidades de oferecer aos jovens a oportunidade de seguir o Curso de Medicina Veterinária. Muitas destas Unidades de Ensino têm boas opções de Cursos de Especialização e/ou de Mestrado, permitindo que os Médicos Veterinários ampliem e atualizem seus conhecimentos tornando-se mais aptos para o desempenho de suas importantes funções.
O que realmente demonstra o progresso da profissão é a intensificação das atividades desenvolvidas pelos Médicos Veterinários. Nas cidades de maior porte, temos Clínicos de Pequenos ou de Animais de Companhia que se subdividem em grande número de especialidades e oferecem aos seus pequenos e importantes pacientes, excelentes opções tanto para diagnóstico como para tratamento e prevenção de diferentes patologias.
As espécies de interesse econômico são criadas seguindo técnicas avançadas, possibilitando melhor qualidade, melhor ganho de peso e o processo produtivo é muito mais rentável do que no passado, com a alimentação dentro de padrões científicos e a reprodução obedecendo a critérios estabelecidos pela Biotecnologia. As condições de sanidade vêm sendo aprimoradas e os serviços de Inspeção e de Tecnologia de Produtos de Origem Animal seguem padrões internacionais. Estas garantias de qualidade e sanidade são importantes porque a exportação de produtos de origem animal é uma fonte de divisas e só podemos ser competitivos se formos capazes de oferecer produtos que se enquadrem nos padrões exigidos pelo mercado internacional.
Outro campo em que a Medicina Veterinária vem se destacando está relacionado com o problema de animais silvestres sobretudo a proteção de espécies ameaçadas de extinção. Em várias frentes de trabalho em nosso estado existem áreas de preservação e se procura divulgar a importância da proteção de espécies ameaçadas de extinção, visando a conscientização de nosso povo.
Cabe, ainda, aos Médicos Veterinários, através de técnicas com embasamento científico, melhorar as condições de nossa aquicultura.
Somando este conjunto de ações, podemos concluir que o trabalho dos pioneiros, cujo idealismo permitiu a criação de nossa primeira Escola de Veterinária, foi coroado de êxito. O panorama da sanidade animal e o incremento da capacidade produtiva do estado podem ser um termômetro da evolução da Medicina Veterinária no Paraná. Desenvolvemos muitos aspectos industriais mas não perdemos a vocação inicial de nosso estado, relacionada com a pecuária e através desta atividade, cujo peso é significativo em nossa economia, estamos gerando empregos e fixando o homem à terra.

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Autora: Clotilde de Lourdes Branco Germiniani - Professora Titular ( Aposentada ) da UFPR, Membro do Centro de Letras do Paraná, da Academia Paranaense de Medicina Veterinária, do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e da Academia Brasileira de Medicina Veterinária.

 


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