Geral
Aspectos da legislação ambiental sobre resíduos oriundos de serviços de saúde
Artigo
O lançamento de matérias no meio ambiente fora dos padrões estabelecidos e as atividades que afetem a saúde o bem-estar da população, dentre outras situações são consideradas pela Lei Federal 6.938/1981 (artigo 3º, III, alíneas a, c) como poluição (degradação da qualidade ambiental). Assim, é evidente que a destinação não adequada de resíduos constitui atividade poluidora, que é penalizada pelas leis ambientais. O motivo desta consideração é simples: é direito de todos a existência de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, que é essencial à sadia qualidade de vida (artigo 225 da Constituição Federal).
Dentre os resíduos a serem objeto de adequado controle estão aqueles oriundos dos serviços de saúde (em geral), já que produzem grande dano ambiental se lançados diretamente no meio ambiente. Estes resíduos, por sua natureza, podem ser gerados por estabelecimentos que atuam na área da Medicina Veterinária. Disso decorre a existência de um grande número de normas que regulamentam o assunto.
Ante a existência dessas normas, é imperativo que os profissionais que atuam na área da Medicina Veterinária, um evidente serviço de saúde, dêem a devida atenção à legislação ambiental que regula a matéria, sob pena de cometimento de crime ambiental e a aplicação de sanções (especialmente multas) pelos órgãos ambientais (tal como Instituto Ambiental do Paraná e órgãos ambientais municipais).
Na esfera Federal, a destinação final dos serviços de saúde é regulada por resoluções da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Resolução RDC 306/2004) e do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Resolução Conama 358/2005). Ambas as normas, cujos textos integrais podem ser acessados no sítio do CRMV/PR na internet, estabelecem a obrigatoriedade de gerenciamento adequado dos resíduos oriundos de todos os serviços relacionados com o atendimento à saúde humana ou animal, incluindo os serviços de: assistência domiciliar e trabalhos de campo; laboratórios analíticos de produtos para saúde; necrotérios, funerárias e serviços onde se realizem atividades de embasamento (tanatopraxia e somatoconservação); serviços de medicina legal; drogarias e farmácias, inclusive as de manipulação; estabelecimentos de ensino e pesquisa na área de saúde; centros de controle de zoonoses; distribuidores de produtos farmacêuticos; importadores, distribuidores e produtores de materiais e controles para diagnóstico in vitro; unidades móveis de atendimento à saúde; serviços de acupuntura; serviços de tatuagem; dentre outros.
Pela lista apresentada fica claro que os consultórios, clínicas e hospitais veterinários estão incluídos dentre os estabelecimentos que demandam o gerenciamento dos resíduos de saúde, bem como aqueles estabelecimentos que comercializem medicamentos veterinários.
Genericamente, as normas estabelecem que cabe aos geradores de resíduos de serviço de saúde acima listados o gerenciamento dos resíduos, desde a geração até a disposição final, de forma a atender aos requisitos ambientais, de saúde pública e de saúde ocupacional. Ou seja, é de responsabilidade do gerador do resíduo o seu gerenciamento, desde sua geração até o seu depósito final. Os procedimentos deste gerenciamento são estabelecidos nas resoluções mencionadas, conforme o tipo do resíduo de serviço de saúde gerado pelo estabelecimento. Destaca-se, ainda, que os responsáveis pelos estabelecimentos devem despender a maior atenção ao contratar empresas que prestem serviços de coleta, transporte e disposição final desses resíduos, tomando cuidado em verificar não só a existência de licença ambiental dessas empresas, mas em verificar se elas efetivamente dão adequada destinação àqueles resíduos. Esse cuidado justifica-se pelo fato de que, mesmo após encaminhar o resíduo para uma empresa que preste aqueles serviços, o estabelecimento gerador (consultório, clínica ou hospital veterinário), nos termos da legislação ambiental brasileira, é co-responsável com relação a danos ambientais causados no momento da coleta, do transporte e disposição final dos resíduos de serviços de saúde. Assim, por exemplo, se determinada clínica veterinária contrata empresa com licença ambiental que realiza a coleta, o transporte e a destinação final de seus resíduos, mas esta empresa os lança em local inadequado, a clínica é co-responsável pelos danos causados ao meio ambiente, respondendo solidariamente à empresa contratada. Esclareça-se, responsabilidade solidária é aquela na qual as partes respondem conjuntamente e diretamente pelo dano causado.
Essa responsabilidade, ainda, é objetiva (sem ocorrência de culpa), ou seja, mesmo que a clínica demonstre todos os cuidados no momento da seleção do prestador de serviço de recolhimento e destinação dos seus resíduos (tal como verificar a existência de licença ambiental), ela é responsável solidária pelos danos causados. Não é necessário que demonstre a intenção do estabelecimento em violar a lei, nem que este agiu com negligência, imperícia ou imprudência. A simples geração do resíduo e sua destinação inadequada (mesmo que por terceiros) é fato suficiente para gerar o dever de reparar o dano.
Já no âmbito do Estado do Paraná, a matéria é regulada pela Lei 12.493/1999 (que estabelece que as atividades geradoras de resíduos sólidos de qualquer natureza são responsáveis pelo seu acondicionamento, armazenamento, coleta, transporte, tratamento e disposição final, dentre outras), pelo Código de Saúde do Paraná (Lei 13.331/2001) e pela Resolução Conjunta SEMA/SESA 02/2005 (que estabelece as diretrizes para a elaboração de Plano Simplificado de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde para Geradores de até 30 litros por semana). Na esfera estadual, destaque-se ainda a Lei 13.039/2001, que estabelece a responsabilidade das empresas de distribuição de medicamentos (em sentido amplo) em dar destinação adequada a medicamentos com prazos de validade vencidos.
Destaca-se, também, a possibilidade de existirem normas municipais específicas sobre o tema, já que os Municípios têm competência para legislar sobre meio ambiente. Mais informações sobre eventuais normas municipais devem ser obtidas diretamente nas Secretarias Municipais de Meio Ambiente (ou equivalentes).
Por fim, além de eventual reparação de danos causados pelo não gerenciamento adequado dos resíduos de serviços de saúde, a destinação equivocada desses resíduos pode implicar no cometimento de crimes ambientais com penas de reclusão que variam de seis meses a um ano, nos termos dos artigos 54 e 56 da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998). Destaque-se que o artigo 56 dessa lei apresenta redação ampla, abarcando diversas atividades envolvidas no gerenciamento de resíduos de serviços de saúde: “Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos”.
Além disso, independentemente daquela obrigação de reparação de danos e da aplicação de pena criminal, o estabelecimento pode ainda sofrer a aplicação de sanção administrativa pelo órgão ambiental competente, cujos valores variam conforme o dano causado, nos termos dos artigos 41 e 43 do Decreto Federal 3.179/1999, cujas multas (dentre outras sanções) podem variar de R$ 500,00 a R$ 50 milhões, dependendo da intensidade do dano causado e das condições concretas da infração cometida. Entretanto, ao contrário da responsabilidade civil (reparação dos danos), a responsabilidade penal e a administrativa são subjetivas, ou seja, dependem da demonstração da intenção ou a negligência, imperícia ou imprudência do agente.
Assim, sendo obrigatória a adoção de procedimentos de gerenciamento dos resíduos oriundos de serviços de saúde (dentre os quais inclui-se os consultórios, clínicas e hospitais veterinários, além de estabelecimentos que comercializem medicamentos), torna-se relevante que os responsáveis legais por estes estabelecimentos adotem as medidas adequadas para que sejam cumpridos esses requisitos legais, especialmente com relação à destinação final dos resíduos. Em adição, é obrigação do responsável técnico desses estabelecimentos, a orientação para a adoção de medidas preventivas e reparadoras a possíveis danos ao meio ambiente, informando-se sobre a legislação ambiental (artigo 14, VII do Manual de Orientação e Procedimentos do Responsável Técnico - Resolução CRMV-PR 01/2005).
Por Leonardo Serafim Zagonel e Carlos Douglas Reinhardt Jr., assessores jurídicos CRMV-PR