Saúde Única
Tem sempre um médico-veterinário garantindo a segurança da proteína de origem animal
Uma projeção da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO/ONU), feita em 2013, dá conta de que, em 2050, a população mundial será de 9,8 bilhões de pessoas. Isso representa mais 29% sobre o total atual, sendo que o crescimento maior ocorrerá nos países em desenvolvimento. Por consequência, será necessário aumentar a produção de alimentos em 70%, bem como a de carnes, que precisará chegar a mais de 200 milhões de toneladas.
É nesse cenário que o Brasil desponta como um dos principais players do mercado mundial na produção de proteína animal. O país ocupa, atualmente, o segundo lugar em carne bovina, terceiro em aves e quarto em suínos, de acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Na exportação, ocupa o primeiro (carne bovina e de frango) e o quarto lugar (suínos). Como garantir a inocuidade desses alimentos de origem animal para que cheguem em segurança e livre de contaminações à mesa de milhares de brasileiros e da população mundial?
A resposta é simples. Do campo à mesa do consumidor, tem um médico-veterinário inserido em cada etapa da cadeia produtiva dos alimentos de origem animal para resguardar a segurança desses produtos consumidos diariamente por milhões de pessoas. O trabalho desenvolvido por esses profissionais é fundamental para a vigilância e garantia da sanidade animal, além de contribuir para manter o nível do status sanitário que o país adquiriu, reconhecido internacionalmente pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) e tão importante para a abertura de novos mercados e acordos comerciais.
Também é competência privativa do médico-veterinário a inspeção e fiscalização sanitária, higiênica e tecnológica de matadouros, frigoríficos e demais derivados da indústria pecuária e, de modo geral, de todos os produtos de origem animal nos locais de produção, manipulação, armazenagem e comercialização, segundo a Lei nº 5.517/1968. Isso significa que os alimentos de origem animal e seus derivados encontrados nas gôndolas dos supermercados passaram por algum tipo de inspeção do serviço oficial, imediatamente identificados pelo selo, que pode ser federal (SIF), estadual (SIE) ou municipal (SIM).
A médica-veterinária Isabelle Campello, especializada em vigilância sanitária e qualidade dos alimentos, esclarece que o papel do médico-veterinário é justamente prevenir doenças e contaminações, intencionais ou não, nos produtos de origem animal. “A contaminação acidental se refere à food safety, ou seja, quando não há intenção prévia ou vantagem econômica por trás da presença do perigo no alimento. As contaminações intencionais e adulterações são abordagens dos programas food defense e food fraud, que contêm uma motivação ideológica ou geram ganho econômico”, explica.
O conceito de food safety abrange os perigos físicos: pedra, vidro, madeira ou plástico. Muitas vezes ele é visível e pode causar prejuízo à saúde, como um corte na boca, por exemplo. Os perigos químicos são resíduos de material de limpeza das linhas de produção, maquiagem ou perfume. Os perigos biológicos podem ser bactérias, fungos, vírus e parasitas inerentes à matéria-prima ou presentes no ambiente de processamento, causadores de patologias chamadas toxi-infecções alimentares. Listeria monocytogenes (vômito e diarreia), Clostridium botulinum (botulismo) e Salmonella (salmonelose) são alguns exemplos de perigos biológicos.
Já o food defense, ou defesa dos alimentos, visa à proteção contra os ataques intencionais, sejam eles físicos, químicos, biológicos, radiológicos ou nucleares, por uma motivação ideológica, vandalismo, sabotagem ou até mesmo bioterrorismo. É um requisito para a exportação de alimentos. Os Estados Unidos, por exemplo, exigem que todos os países exportadores tenham um programa de food defense implantado nas suas indústrias alimentícias. Food fraud mira ganhos econômicos, porém a ação pode resultar em risco à saúde do consumidor, como foi o caso, ocorrido em 2008, envolvendo leite em pó com melamina, levando à morte de seis bebês e mais de 50 mil hospitalizados com problemas urinários e renais.
Diante da atual crise sanitária mundial, causada pela pandemia da covid-19, o médico-veterinário torna-se cada vez mais essencial para a manutenção da produção e garantia da segurança dos alimentos. A ausência desse profissional na cadeia de produtos de origem animal pode provocar impactos significativos na saúde pública, gerando o aumento da demanda por leitos hospitalares para o tratamento das toxi-infecções alimentares, sobrecarregando ainda mais o sistema de saúde. “Por essa razão, o médico-veterinário também cuida da saúde da população, garantindo o alimento seguro”, afirma Isabelle, que há 13 anos atua na área de Inspeção Higiênico-Sanitária de Produtos de Origem Animal.